Quando os números oficiais da apuração do referendo de ontem começaram a demorar horas a mais do que o previsto, a oposição desconfiou que Hugo Chávez desenhava sua estratégia frente a uma derrota.
O resultado da vitória do "Não" às 69 mudanças na Constituição ? incluindo a que permitiria ao presidente da República concorrer à reeleição ilimitadamente ? veio a se confirmar às 3h07min pelo horário de Brasília (1h07min em Caracas), surpreendendo chavistas que já tomavam as proximidades do Palácio Miraflores. O placar final foi 49,29% para o "Sim" e 50,71% para o "Não".
A surpresa com o resultado da votação não foi injustificada. Além dos números das pesquisas de boca-de-urna ? que apontava vitória chavista por percentuais que variavam de 53% a 56% ?, Chávez vencia todas as eleições desde 1998, quando se elegeu presidente pela primeira vez. Desde então, passou por mais duas reeleições e por um plebiscito. A derrota de ontem foi o primeiro revés do chavismo.
Às 2h desta segunda-feira, fontes ligadas ao órgão responsável pela apuração dos votos declaram extra-oficialmente que o resultado teria sido apertado, inflamando ainda mais a oposição. Cerca de 40 minutos depois, o deputado Ismael García ? ex-aliado de Chávez e hoje um dos principais nomes da oposição ? intimou o Conselho Nacional Eleitoral a anunciar imediatamente o resultado. Segundo ele, 85% dos votos já teriam sido apurados. Outros aliados contra Chávez fizeram coro. "O povo quer saber. Nós não queremos especulação", declarou outro expoente da oposição, o prefeito de Baruta, Henrique Capriles.
Antes mesmo de confirmada a vitória, diante dos números desfavoráveis da boca-de-urna, a oposição comemorava o equilíbrio da eleição. Na quinta-feira passada, uma multidão de 200 mil pessoas tomou a Avenida Bolívar, em Caracas, para dizer não a Chávez. Como o voto não é obrigatório no país, o que se viu foi um imenso apelo ? mobilizado por universitários ? para que os venezuelanos se mantivessem unidos contra as reformas do presidente até o domingo.
No dia seguinte, a resposta chavista veio como se esperava: ainda maior, com trajes vermelhos e os logotipos de "Sim" da campanha chavista. Entretanto, claramente era a primeira vez que Chávez era convocada a responder a uma oposição com chances de vitória.
Logo em seguida ao resultado, Chávez veio a público anunciar sua derrota em rede nacional. Frente a um painel de Simón Bolívar, o presidente demonstrou claro abatimento ao dizer que a diferença havia sido "microscópica". Segundo ele, foi sua decisão não esperar a contagem de votos manuais para anunciar o resultado, que já era irreversível. "A Venezuela não merece esperar mais", declarou em voz baixa. Rabiscando papéis, Chávez declarou: "Reconheço a decisão que tomou o povo. Firmamos um compromisso e respeitamos a regra do jogo. Mas temos que foi uma decisão por uma margem pequena".
Tão logo a vitória do "Não" foi anunciada, um buzinaço tomou conta das ruas de Caracas para uma festa que adentrou a madrugada. Simultaneamente, os chavistas começavam a deixar as proximidades do Palácio de Miraflores, onde comemoravam vitória antecipadamente. Para os venezuelanos que o querem por tempo indeterminado, Chávez ainda deu esperança, logo após citar Simón Bolívar: "Essa proposta não está morta".