Força do Pensamento 4 - Palestrantes apresentam contexto da educação gaúcha; O quadro é preocupante
Jousi Quevedo

Painelistas apresentaram um quadro bastante preocupante sobre a educação gaúcha, como a distorção previdenciária que toma recursos regulares na área e a defasagem do plano de carreira do magistério.

A 4ª edição do Força do Pensamento iniciou na manhã desta segunda-feira e abordou como tema Educação: fator estratégico para o desenvolvimento. O evento, que ocorre na sede da Força Sindical-RS, reúne imporantes lideranças da área de educação, que discutem os problemas, desafios e soluções do ensino e da aprendizagem na escola no Rio Grande do Sul e no Brasil.

O discurso de abertura foi proferido pelo presidente da central, Clàudio Janta, que afirmou que a educação é o alicerce de todas as lutas da Força Sindical-RS. "A base de tudo é a educação e quem mais representa essas necessidades são os filhos dos trabalhadores. Precisamos saber como está a educação. Discutir as melhorias para a busca da educação, desde a profissionalizante até a acadêmica, dos acessos a quem busca emprego e educação, todo este universo nos interessa. O debate é a busca do único bem que ninguém pode nos tirar, que é a educação. Aproveito e parabenizo os professores pelo seu dia. Vamos discutir essas questões dentro das fábricas, das lojas", afirmou

"É bom lembrar ainda que sem educação jamais seremos um país de primeiro mundo, não adiantando dar conselhos para economia mundial se não tivermos um nível de educação adequado interno, e neste quesito a educação está muito aquém em nosso país", disse Janta.

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O primeiro painel, Educação - Base para o futuro, contou com os convidados Paulo de Tarso (Economista e Coordenador a Agenda 2020) e Ana Claudia Figueroa (Diretora Departamento de Logística e Suprimentos da Sec Est de Educação e representante do secretário de Educação, José Clóvis .

Paulo de Tarso afirmou que tudo que se pretende fazer em educação deve começar com a maior brevidade possível, pois nenhum resultado se colhe em menos de 15 anos. "O Brasil conseguiu alguns avanços necessários, mas ainda não temos as condições iguais de países que colocaram todas as crianças na escola há 20 anos atrás. Portanto, estamos atrasados. A educação não é um processo de resultado imediato, é de médio a longo prazo", explicou.

Segundo o painelista, a educação é uma das questões mais importantes da Agenda 2020 e do desenvolvimento do RS. A educação no Estado vem ano a ano perdendo posição no contexto nacional. "O RS, nos anos 1950-60, foi o primeiro estado em qualidade da educação. E me refiro a educação pública", afirmou Paulo de Tarso.

Conforme dados do Ideb, nas séries iniciais o RS ficou em 6º em 2005; em 6º em 2007 e 6º em 2009. Nas séries finais, passou de 3º para 7º e depois para 6º. No ensino médio, 4º, 7º e 3º. "Essas posições demonstram que a educação no Estado está em posições críticas se comparado com o que já foi. E não é apenas a educação pública, a privada também", destacou.

As medidas para a retomada da qualidade da educação são de caráter estrutural e envolvem sociedade, governo, professores e alunos. A perda de qualidade tem origens nacionais, mas no RS o grau de exigência é maior que o contexto nacional em decorrência do que já foi, um estado que tinha um ensino qualificado e acima da média.

O problema não se explica pelos recursos, demonstra o painelista, uma vez que o RS recebe mais recursos do Fundeb se comparado a SC, PR e MG, mas perde posições para estes estados. "Então, alguma coisa não está funcionando nesta equação. Detectamos que há uma distorção previdenciária que compromete o orçamento da educação no Estado", disse. Os inativos são pagos pelo orçamento regular da educação. Na relação aluno/professor nas redes estaduais o RS aparece abaixo da linha Brasil.

A carreira do magistério apresenta pontos de atrasos também. O palestrante esclareceu que os inativos devem receber seus salários e ter seus direitos respeitados, seguramente, mas a questão é mudar a fonte dos salários, não sendo a origem dos vencimentos o percentual destinado para investimentos na educação.

Diante deste quadro, a política pública de educação deve oferecer resultados claros, melhorando o nível de educação no Estado, aumentar e qualificar a formação profissional para gerar crescimento econômico sustentável. Assim, a universalização da educação básica de qualidade se assenta nos pilares de acesso e permanência, avaliação da aprendizagem, valorização do magistério e recursos.

"Não basta colocar todas as crianças e jovens dentro da sala de aula, mas colocá-los num processo de qualidade, para que queiram permanecer, e gerar estímulo para os professores", destacou.

As soluções passam, segundo o representante da Agenda 2020, pela flexibilidade orçamentária do governo, pela atualização do plano de carreira do magistério e pela construção de uma pauta mínima para educação entre governo, magistério e sociedade. "O plano de carreira do magitério é extremamente defasado, foi escrito por um coronel, há muitos anos. E esse plano tem sido 'vendido' como uma conquista dos professores", criticou.

A palestrante Ana Claudia Figueroa, da Secretaria Estadual de Educação, fez sua abordagem da educação como parte dos direitos sociais do ser humano. O dinheiro e como é aplicado tem sido uma lógica mal colocada na relação com educação, disparou de antemão. "A qualidade da educação não se mede em valores monetários, mas isso deve ser invertido. O capital deve estar a serviço da qualificação do ensino", disse.

As tecnologias alteram, assim com as questões ambientais, o nível das tomadas de decisão que refletem na educação. Outro ponto levantado pela palestrante é a inserção econômica de parcelas da população que antes não estavam inseridas no contexto econômico. "Quero destacar que a educação nestas mudanças se torna cada vez mais inegociável no que tange aos seus pilares de sustentação da sociedade. Agregar estas novas realidades sem gerar preconceitos e garantir a educação universalizante são concretizações perseguidas por todos", disse.

"A base de saber pensar está na escola, na forma de apropriação do conhecimento. Há uma discussão de currículo aí que estamos fazendo. Além disso, como vamos criar indicadores para medir a aprendizagem e seu desenvolvimento para daqui 10, 20 anos?", colocou Ana, apresentando um dos grandes desafios da área.

A educação como política pública se pensa em décadas, porque os efeitos se dão a longo prazo, completamente diferente do ciclo da gestão pública e diferente da lógica de mercado.

A palestrante também referiu a diferença da atualidade para com situações passadas. "Hoje vivemos outra realidade, temos outras necessidades e complexidades pedagógicas que pouco lembram o passado. Por isso temos que discutir novas práticas, e isso inclui o currículo e o plano de carreira do magistériio", disse Ana Claudia.

"Temos um problema orçamentáriio concreto para ser resolvido. E um déficit para ser resolvido. Então, como vamos qualificar a educação no seu cerne, discutindo o currículo e integrando as demandas sociais apresentadas pelo Paulo de Tarso? São elementos da tomada de decisão e que devem incluir as ações para garantir a qualificação da educação", disse.

Antônio Johann (Presidente do Senalba-RS) disse estar honrado em mediar o primeiro painel do evento.

Nos questionamentos do público, presidente Janta questiona como a educação na escola pública enfraqueceu tanto. Já o diretor Cláudio Côrrea questionou qual a escola que se pretende no país e no Estado e qual a prioridade às escolas de tempo integral.

Outro participante questionou como a reformulação e o aperfeiçoamento de educandos e educadores está sendo implementada pelo governo atual.

Participante questionou ainda como resolver a educação atual se não houve um planejamento prévio e outra participante manifestou sua preocupação com a violência na escola e o despretígio dos professores que cobram leituras e buscam mais atividades para seus alunos. Ela colocou a realidade dos bondes de crianças, a gravidez infantil e a violência contra professores.

Ana respondeu que "há um consenso em se chegar a escolas de turno integral. Mas há diferenças tipologias de como seria possível isso". Segundo ela, se entra em um novo desafio para ter condições materiais concretas das escolas integrais.

A educação moral exige, segundo Ana, outra atitude pedagógica que, por abandonar um velho modelo, os professores tem de se adequar a novas propostas pedagógicas. Esta educação moral a que se refere a painelista diz respeito ao comportamento dos alunos, educação familiar e demais situações polêmicas que ocorrem nas escolas como drogas, gravidez e violência. Quanto às escolas públicas de antigamente em que alunos de ensino estadual ingressavam em boas universidades, Ana destacou que a seleção nas escolas antes era muito mais rigorosa, mas que mesmo assim muitas pessoas humildes passavam.

"No governo estadual, pretendemos consolidar os conselhos escolares com gestores locais e o sistema de avaliação proposto inclui o fortalecimento de processos de formação para a gestão", disse Ana.

Paulo de Tarso disse que é necessário traduzir um caminho a partir do lugar que se quer chegar para planejar a educação. A Coréia, por exemplo, se preparou para este futuro tendo como guia a inovação. "É necessário ter essa questão como uma estratégia", disse. O turno integral, conforme Paulo de Tarso, é uma educação de tempo integral, tirando o papel da escola de posto de criança, mas como gerenciador de um projeto continuado.

O painelista acredita que não há modelo de educação de outros países para ser aplicado no Brasil diretamente, mas que podem servir de inspiração. O Sasi está em processo de expansão, segundo Ana, e citou outros programas como o Mais Educação.

Fernando Rosa, assessor de imprensa da Força, e Sílvia Duarte, produtora cultural da central, fizeram perguntas sobre a inserção no currículo de matérias ligadas à arte e as leis que garantem esse direito. Fernando também falou da polarização de classes dentro das escolas. Paulo de Tarso disse que com o passar do tempo houve mais variações e complexificaçõoes das classes sociais, afirmando que precisa haver um objetivo sobre o que a educação deve oferecer. "A estratégia tem que ser libertadora e deve ser definida, porque hoje é diferente a realidade de quando nós estudávamos e os conflitos são diferentes", disse.

Mariza Abreu, ex-secretária de Educação, disse que há uma mudança de classe e de função social da escola para os tempos atuais. Primeiro, porque o acesso à escola universalizante está estabelecido - o que não implica a conclusão -, a atitude do professor é diferente e há um novo paradigma da evolução social que mudou a função da escola, o que atinge os professores que ministram suas aulas baseados no modelo antigo.

Ana mencionou que o maior problema na questão das classes é o preconceito racial. E que as leis muitas vezes existem, mas não são cumpridas. "Para resolver as tessituras nas escolas, temos que resolver as desigualdades de origem étnicas - religiosas e raciais - e sexuais. Esses problemas nos anos 1960 não existiam ou eram menos acirrados. O professor, portanto, está ali com sua realidade social mitigada com a realidade social a frente", explicou. Há um esforço a ser feito para resolver essas questões, que estão ligadas com a efervescência econômica e as mudanças do país da atualidade, disse a professora.

Em suas considerações finais, Paulo de Tarso destacou que o tema da educação exige convergência, com uma pauta mínima do que é necessário alcançar. Ana parabenizou a Força pela iniciativa e espera colaborar mais vezes com o debate que é fundamental.

Texto: Josemari Quevedo

Fotografia: Daiana Rodrigues

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