Empresas precisam adotar políticas de retenção da mão de obra
Jousi Quevedo

Conheça os fatores que influenciam na hora de mudar de emprego.

O empregador também é responsável pela rotatividade de mão de obra no mercado de trabalho quando não adota políticas de retenção do empregado. Fatores como ambiente dentro da empresa, relacionamento com os colegas de trabalho, benefícios oferecidos pelo empregador ao funcionário e à família são determinantes no momento de se decidir trocar ou não de emprego.

“É preciso que se faça constantemente pesquisas dentro de uma empresa para saber se os funcionários estão satisfeitos. O trabalho é uma via de mão dupla. A empresa tem que escolher o funcionário e vice-versa. Quanto mais as regras estiverem claras nesse meio campo, maiores são as chances de ter retenção mais efetiva de mão de obra”, informou a especialista em recursos humanos, Rita Brum.

O setor público é o que menos demite trabalhadores, segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A taxa de rotatividade de empregos na administração pública, em autarquias e em empresas de prestação de serviços públicos é a mais baixa, entre 10,6% e 12,2%; contra 86,2% na construção civil, seguida pela agricultura (74,4) e pelo comércio (41,6).

No entanto, há trabalhadores na iniciativa privada e em setores com altos índices de rotatividade que mantêm seus empregos há muitos anos. Esse é o caso de Samuel Carvalho, 48 anos, garçom no mesmo restaurante desde os 20 anos. Depois de 28 anos de casa, ele diz que o relacionamento com o patrão é importante para que ele não queira deixar a empresa.

“Atendo cerca de cem clientes por dia, tenho muito respeito tanto por eles quanto pelo meu patrão, por quem, hoje, tenho muita amizade e consideração. Para conseguir ficar aqui todos esses anos, é preciso muita honestidade e também não dar motivos de se reclamar”, explicou.

O colega de Samuel, Antônio de Araújo, 50 anos, também é funcionário do mesmo restaurante há 20 anos. Para ele, não há prejuízo em manter o emprego por tanto tempo.

“Estar aqui há tantos anos dá força tanto para nós quanto para o patrão. Muitos clientes já são amigos e vêm porque estão acostumados. Só penso em sair daqui quando me aposentar”, explicou Araújo.

Segundo o patrão dos garçons, Rubem Lucena, a necessidade de constante atendimento ao público faz que o tempo de casa dos funcionários seja benéfico.

“Eles já têm os clientes próprios e, como trabalham sobre comissão e gorjeta, isso é importante para o salário final”, informou Lucena.

De acordo com a consultora Rita Brum, as empresas têm tido cada vez mais consciência da necessidade de deixar claro que há preocupação com o funcionário.

“O empregador precisa criar uma relação de fidelização e aplicar ferramentas que mantenham a pessoa no cargo. Há quem troque de emprego por causa de R$ 100, mas se há um clima adequado e agradável, se pensa melhor e se vê que o que conta não é só o salário”, explicou.

Rotatividade preocupa governo

A rotatividade nos postos de trabalho vem crescendo no país, ao longo dos últimos anos. De acordo com estatística da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a taxa de rotatividade alcançou 36 pontos em 2009, número mais recente. Dois anos antes, era 34,3 pontos. O ministro do Trabalho e Emprego, Brizola Neto, já manifestou preocupação com o fenômeno.

Brizola Neto defender a regulamentação do Artigo 239 da Constituição Federal como forma de conter o aumento dessa estatística. No Parágrafo 4º da norma, há a previsão de pagamento de contribuição adicional por parte das empresas com rotatividade acima da média de seu setor. A rotatividade informada pela Rais é medida em uma escala de 0 a 100. Quanto mais alta, maior o risco de se perder o emprego.

O crescimento da rotatividade medida pela Rais é acompanhado de aumento do desemprego. De acordo com números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), as demissões vêm aumentando nos últimos dois anos. No acumulado de janeiro a julho, 11,8 milhões de trabalhadores perderam o emprego, mais que o dado divulgado em julho do ano passado, quando o governo contabilizou 11,3 milhões de demissões.

As demissões também aumentaram na observação do acumulado dos últimos 12 meses. De agosto de 2011 a julho de 2012 ocorreram 20,1 milhões de demissões. No mesmo período de 2010 e 2011, as demissões somaram 19,1 milhões. No mês de julho desse ano, foram criados mais de 1,7 milhões de empregos formais. No entanto, houve, aproximadamente 1,6 milhões de demissões.

A rotatividade é um dos fatores que levam à precarização das relações de trabalho, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Quanto mais flexíveis as regras para se demitir um funcionário e mais informais os vínculos de trabalho, mais os empregadores tiram proveito da oferta de mão de obra, reduzindo seu custo e os benefícios associados.

A rotatividade, desse modo, pode indicar os níveis de informalidade da economia, de insegurança em relação às remunerações e, ainda, de acesso do trabalhador à proteção social e à Previdência.

O tema é objeto da Convenção 158 da OIT, sobre a dispensa desmotivada do trabalhador, ratificada pelo Brasil em 2008. Segundo essa convenção, um funcionário não deve ser demitido a menos que exista causa justificada, relacionada à capacidade ou ao comportamento e garantido o direito à ampla defesa, ou motivos econômicos, tecnológicos ou análogos, com necessidade de comprovação pela empresa.

Segundo dados da Rais, o setor da construção civil contrata muito, mas é o que mais demite trabalhadores, com taxa de rotatividade de 82,6 pontos. Os setores que têm menos rotatividade, por outro lado, são a administração pública direta, com taxa de 10,6%; os serviços industriais de utilidade pública, com taxa de 12,2%, como o fornecimento de água, luz, esgoto; e os correios – geralmente prestados por empresas também públicas. A estabilidade nesses setores, segundo a Agência Brasil apurou, é um dos maiores atrativos para quem busca trabalhar no serviço público.

As principais causas de desligamento, segundo dados do Ministério do Trabalho, são rescisão sem justa causa por iniciativa do empregador (52,1%), por iniciativa do empregado (19,4%), término de contrato (19,2%), transferência do empregado dentro da mesma empresa (5,9%) e rescisão com justa causa, por iniciativa do empregado ou do empregador (1,3%).

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Trabalhador também se beneficia da rotatividade no emprego**

Apesar da preocupação do governo, há quem identifique na alta rotatividade nos postos de trabalho um sintoma de dinamismo econômico. Para o pesquisador Rodrigo Leandro de Moura, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), a rotatividade no Brasil é causada pelo aquecimento da economia, que estimula os trabalhadores a buscar novas oportunidades de trabalho e melhoria dos níveis salariais.

“Por isso a semelhança entre os dados de admissão e desligamento, as duas variáveis crescem. Apesar das demissões, as empresas também acabam admitindo muitos trabalhadores. Não necessariamente uma empresa faz isso para diminuir seus custos, com menores gastos com mão de obra. A rotatividade é também um indicativo do crescimento da atividade econômica”, explicou Moura.

Marcos Borges, 32 anos, trabalha com montagens de equipamentos usados em construção desde os 20 anos. Desde então, nunca passa mais de dois anos no mesmo emprego. Em média, o tempo de emprego no mercado formal brasileiro é um pouco maior, alcançando 3,9 anos.

“Eu gosto de trocar sempre de emprego. É dinâmico. Sempre estou fazendo e aprendendo coisas novas”, disse Borges. Ele explica que não considera a constante mudança de emprego prejudicial.

Segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), cerca de 42,1% dos vínculos empregatícios são encerrados até os seis primeiros meses de contratação. Apenas 2,6% dos trabalhadores formais permanecem mais de dez anos na mesma empresa.

Para o engenheiro mecânico Diego Alencar, patrão de Marcos, a rotatividade no setor da construção civil está diretamente ligada ao tempo de duração das obras, de dois anos em média.

“Muitos trabalhadores também são chamados para executar serviços mais rápidos, como montagens e instalações, são terceirizados. No entanto, sempre há um estoque relativamente fixo de trabalhadores, o que é interessante pela confiança que se estabelece”, explicou o empresário.

Falta de estabilidade afeta empregos de alta e baixa qualificação

Luiza Pereira, 38 anos, e Teresa da Silva, 32 anos, a Tetê, são amigas e trabalham juntas há 15 anos. São manicures e buscam sempre atuar em dupla. Enquanto uma faz a mão, a outra faz o pé. No último ano, as duas já trocaram de emprego três vezes. Ficaram, em média, cerca de quatro meses em cada salão.

Luiza e Tetê têm famílias para sustentar. Ambas são responsáveis pela maior parte da renda familiar. A constante troca de local de trabalho é um problema na vida das duas. O setor de serviços, em que trabalham, tem índice de 37,7% de rotatividade, segundo a Relação Anual de Informações Sociais (Rais) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), atrás da construção civil, da agricultura e do comércio.

“Tenho medo de sair de casa de manhã e voltar à noite demitida porque o salão fechou ou porque alguma cliente não gostou do serviço”, disse Luiza.

De acordo com o psicólogo e professor na área de psicologia do trabalho e saúde do trabalhador da Universidade de Campinas (Unicamp), Roberto Heloani, a demissão é uma ameaça que ronda boa parte das categorias profissionais. Para ele, a falta de empregabilidade afeta trabalhadores de alta e de baixa qualificação.

“Esse medo de perder ou reter o emprego começa na própria busca. Ter [cursado] uma faculdade não é mais garantia. Há tempos atrás, uma pessoa de classe média fazia uma faculdade e tinha praticamente emprego garantido. Hoje, isso não ocorre mais. Corre-se o risco de ter feito uma universidade de primeira linha e ter dificuldade de encontrar até um estágio. A sensação de incerteza começa cedo”, informou Heloani.

Tetê, a manicure, explicou que, para tentar minimizar o risco de demissão, investiu em cursos na área de estética.

“Aprendi também a fazer sobrancelhas e tratar de cabelos, como fazer hidratação e outros tipos de tratamento. Meu sonho é ter um dia a minha clínica de estética”, disse.

O professor Roberto Heloani alertou, no entanto, contra a busca incessante por capacitação, que nem sempre garante o retorno pretendido. Segundo ele, a atualização do empregado pode ajudar em certos momentos, mas não garante emprego e estabilidade que, em muitos casos, estão relacionados a fatores que não dependem do esforço do trabalhador – como a economia ou as finanças da empresa.

“A lógica de qualificação que temos hoje é idealizada. Se cobra tanto, se quer tanto, que é impossível o trabalhador cumprir todos os requisitos. A angústia acaba sendo um sentimento onipresente. Temos que desconstruir essa lógica. Muitos são demitidos porque são peças que não se encaixam mais em um jogo altamente complexo”, explicou o professor.

Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que transtornos mentais são a maior causa de afastamento no trabalho na última década. Para Heloani, o próprio medo do desemprego acaba levando à demissão, gerando um paradoxo.

“Em primeiro lugar, o trabalhador não pode se culpar e acreditar que não consegue manter o emprego por alguma deficiência ou falta de dedicação. Há uma fortíssima tendência a fazer isso. Os danos psíquicos são muitos, o que engrossa essas estatísticas da OIT, em que boa parte dos casos, o transtorno mental é a depressão severa que acaba levando à incapacitação”, informou.

Fonte: Agência Brasil

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